Digam o que disserem o pior trabalho que alguém pode ter será aquele que envolve público, quase sempre anónimo!
No supermercado, num banco, num consultório, seja onde for desde que tenha público o relacionamento de quem está para aquele que vem deve ser sempre cuidado. Digo com experiência própria.
Na minha vida de trabalho estive 15 anos como caixa de uma tesouraria onde se pagavam milhões. Repito milhões. De tal forma que um tio, irmão do meu pai, também caixa num outro banco quando almoçava comigo perguntava-me sempre: quanto já pagaste hoje? E eu dava-lhe um número aproximado do real valor e que era sempre muito acima do dele.
Noto que as pessoas anónimas estão claramente carentes de uma boa conversa. Daí vermos tantos a demoraram séculos ao balcão, especialmente porque desfiam naquele naco de dia todos os lamentos presos dentro de si.
Hoje fui a uma agência para tratar de um assunto. Cheguei cedo, mas meia hora depois já não havia senhas, porque as pessoas que ali estavam eram suficientes para o dia inteiro. Aguardei a minha vez (mais ou menos uma hora e meia), mas fiquei atento às pessoas que eram chamadas antes de mim. Quase todas idosas e limitadas no seus movimentos. Que refilaram muito sentadas à espera, mas assim que viram o seu número no chamador esqueceram-se da sua revolta e toca de desenferrujarr a língua.
É necessário muita paciência e muita diplomacia para dizer aos clientes que há quem esteja à espera para ser atendido.
Regressando à minha longa espera creio ter sido demais. Ainda por cima com um assunto que ficou esclarecido em dois minutos. Também tenho consciência que as instituições querem trabalhar com menos gente. Minimizar custos, dizem eles. Eu acrescentaria: para maximizar lucros!
Nem vale a pena reclamar pois a respossta será sempre a mesma: não temos pessoal!
Li há muito tempo que "escrever é um acto de profunda solidão"!
Durante anos aceitei esta ideia como imutável e cheia de sentido. É certo que escrevemos quase sempre sozinhos (excepto eu quando estou na Aroeira), mas se entendermos bem, esta solidão só existe de forma temporária, pois assim que alguém pega num texto escrito, a solidão aquando da sua autoria deixa automaticamente de existir! Isto é, quem escreve estará totalmente só se ninguém ler o que escreveu.
Por aqui vou olhando a minha escrita de uma maneira quase simpática. Tem pouco valor o que escrevo pois dificilmente alguém mudaria de maneira de pensar lendo o que escrevi e muito menos alteraria a sua maneira de ser. Todavia não sou um solitário... bem pelo contrário. A interacção que a blogosfera trouxe à escrita tornou-se uma mais valia importante e quase imprescindível! Que nos últimos anos tem, por exemplo, culminado em livro, como por aqui já foi referenciado!
Todavia nada teria sido possível se a tal solidão de quem escreve existisse realmente. Escrevamos apenas um texto ou cinquenta o que fica para a posteridade, para além das mais de duzentas páginas, é o exemplo de coragem, de aventureirismo e acima de tudo de amizade e confiança entre todos os escritores.
O livro com os "Contos de Natal" publicados em 2021 e ora compilados é um exemplo de escrita intemporal e sem quaisquer requisitos, para além do apreço que cada um tem ao esgalhar e publicar os seus textos. Sem julgamentos ou críticas...
Por isso quero convidar todos os que gostam de passar para o papel (ou mesmo para o computador) as suas ideias, principiem a pensar no que escrever sobre o tema "Contos de Natal".
Adoraria ver gente nova a afoitar-se em mais uma aventura, pois a partir do dia 3 de Dezembro começamos já a pensar no próximo livro!
Todos os dias ali passo de manhã no meu carro! É uma casa velha de três pisos. A porta ao meio alta e mal estimada divide os lados dos velhos andares. Nas janelas não há estores, nem portadas. Mas pode-se apreciar a alvura de umas cortinas de renda que não deixam ver para dentro, tirando…
Aquele canto, num rés do chão, onde um enorme gato pardo dorme encostado ao vidro aquecido pela manhã solarenga. E quando não está o felino, surge uma idosa. Provavelmente ambos procuram na rua o interesse que não encontram em casa.
Passo tão depressa que não consigo perceber a idade da anciã, mas carrega muitos invernos, com toda a certeza.
Hoje, pela primeira vez, de há muitos anos a esta parte, a cortina não estava aberta. Não vi nem gato, nem dona…
A pergunta doeu-me fazer: que lhes terá acontecido?
Nota: a foto foi tirada por mim em Angra do Heroísmo, na ilha Terceira. E só serve para ilustrar este texto.