A diferença… vista por dentro
Geralmente ouve-se falar muito de como as pessoas normais reagem àqueles que por diversas razões são diferentes.
Achei deste modo importante falar da visão da diferença vista pelo próprio: como vai vivendo quem é diferente, como aceita as suas limitações, como procura ser feliz.
O relato que se segue corresponde somente à minha pessoa que, sendo eu diferente da maioria das pessoas, ainda assim considero-me um privilegiado.
Começo então pela minha surdez. Em 2012 após dois AVC’s isquémicos acabei por ficar completamente surdo do ouvido direito. E com este evento passei a:
- somente a ouvir uma pessoa de cada vez;
- detestar locais com muito barulho, do género refeitórios, cafés ou bares;
- pedir que falem comigo devagar e não mais alto;
- que sejam pacientes e repitam o que disseram, se eu não ouvir à primeira;
- escolher o lugar mais próximo de um orador sempre que vou a uma reunião.
No entanto a família por vezes não entende esta minha diferença e não consegue lidar bem com a minha surdez. Será, dos meus problemas, aquele que mais me afecta.
Ainda usei um dispositivo, durante algum tempo, para me ajudar mas fazia-me mais mal que bem…
Mas não fico por aqui… Já antes em 1999 tive um grave problema com um descolamento de retina da minha vista esquerda e que originou ficar basicamente cego mesmo após 7 intervenções cirúrgicas.
Não obstante considerar a visão como um dos sentidos mais importantes do ser humano, esta minha deficiência é aquela com a qual melhor convivo por ser, curiosamente, a menos evidente… Porém não posso ver filmes a 3D, a minha noção das distâncias não é regular e tenho de ter evidentes cuidados quando na rua me viro para o lado esquerdo, não vá abalroar alguém…
Posto isto, repito que me sinto um homem com sorte conquanto tenha a perfeita consciência que caminho permanentemente em cima de um fio de uma navalha e que a minha vida é semelhante aos equilibristas em cabos de aço a centenas de metros do chão: qualquer passo em falso e pode ser a morte do artista.
No meu caso específico ou fico completamente invisual ou completamente surdo.