Nunca me preocupei pela forma como um dia serei ou não recordado. Geralmente esta ideia só surge quando já somos ou muito velhos ou prestes a embarcar para o outro lado.
Ainda por causa da distribuição dos meus livros telefonei a um antigo colega (ainda no activo) e amigo a questioná-lo sobre a morada. Ele deu-me outra e depois acabámos por falar do trabalho. Confessava ele:
- Mesmo depois deste tempo todo longe da empresa ainda fazes muita falta. Lembro-me tantas vezes de ti...
Agradeci, mas imaginei que estivesse a exagerar. Devolvi-lhe este meu pensamento ao que ele deu um troco inesperado:
- Sabes que um destes dias houve um problema, depois do apagão, que ninguém, em tempo útil, conseguiu resolver. No meio de tanta barafunda houve alguém que disse em voz alta que se tu cá estivesses o problema estava já resolvido.
Eu nem comentei, mas só imaginei como deveria ter ficado o meu antigo chefe com quem tive tantas e ásperas bravatas, o tal que um dia me disse que tinha um complicómetro dentro da cabeça.
Despedi-me do meu amigo para finalmente poder sorrir.
Esta tarde encontrei um antigo colega de trabalho. Com idade para ser meu filho é hoje um alto quadro da empresa. O curioso é que foi ele que me abordou.
Cumprimentos para cá e para lá quando a determinada altura pergunta o que faço na minha reforma, respondo-lhe com os netos e... os livros.
É nesta altura que ele se surpreende com as minhas actividades, nomeadamente a que se refere à minha escrita, quando faz a pergunta sacramental:
- E escreves sobre o quê?
Esta é uma daquelas questões para a qual eu ainda não consegui arregimemtar uma resposta a preceito. Nesta altura fico sempre com a sensação que a aprovação da minha acção ficará condicionada ao que escrevo. Se for um romance terá um nivel de aprovação maior que aquele constituído por pequenas estórias como são os meus livros.
Tenho consciência que escrever um romance será um acto de enorme valentia e empenho. De suor e muitas lágrimas. De avanços e muitos recuos e, acima de tudo, de muito, muuuuuuuuuuuito trabalho.
Já para não falar de investigação!
Muitos dos meus leitores vão apertando comigo para que escreva um romance. Sei que têm razão no pedido, mas tal como escrevi acima, para tal necessito de tempo, muito tempo algo que não abunda por aqui.
Portanto... o melhor mesmo é ir vivendo um dia de cada vez e tentar perceber o que diariamente podemos conquistar!
Tenho alguma dificuldade em recordar a forma como lidei com os meus filhos quando eles tinham a idade dos meus netos. Mas acredito que tivesse pouca paciência para eles. Isto é muuuuuiuto menos paciência que tenho agora para os meus netos.
A pequenita já vaoi todos os dias para a pré-primária o que faz com que a veja muito menos do que seria de supor! Todavia sou compensado pela presença do irmão de um ano e que é neste momento da minha vida a estrela dos meus dias.
Como qualquer criança desta tenra idade tudo serve para brincar e acima de tudo para... fazer barulho. Algo que o puto adora.
Se há trinta ou mais anos eu daria um ralhete e retiraria os instrumentos de ruído aos meus infantes por me faltar a tal de paciência ao fim de um dia de trabalho, agora deixo esta criança brincar, divertir-se pois a paciência jamais fica torrada.
Ser avô é muito mais do que ser o mais velho da família (no meu caso isso não acontece porque ainda tenho pai e mãe!!!), é ser capaz de saborear todos os momentos em que posso ter a companhia dos meus netos.
As crianças são assim o instrumento perfeito para a transformação para melhor de um ser humano. Basta para isso que sejamos capazes de perceber quão importante aquelas serão na vida de cada um de nós!
Provavelmente para muitos que aqui aparecem dirão: já tem idade para ter juízo e não se meter nestas andanças de blogues e de escrita.
Por vezes até dá para concordar com eles, porém a maioria das ocasiões estou muito longe dessa vontade e desejo e... acabo por ir arriscando.
Há quem diga também que a idade é somente um simples número. Eu acrescento que é um algarismo arrepiante, pois jamais pensei chegar a este singelo par.
Ora bem... sempre que chega a este "meu" dia do ano, dou por mim a relembrar o passado com (a)normal nostalgia e saudade, mas outrossim a temer o futuro. Não que tenha qualquer receio de morrer, mas não gostaria que os meus descendentes vivessem neste Mundo permanentemente em guerra. Pois é, isto preocupa-me deveras!
Jamais serei um homem rico em dinheiro e bens, mas também tal não me tira o sono até porque o vil metal, vá eu para onde for depois de morto, não me servirá para nada.
Por tudo isto prefiro deixar aos meus descendentes, filhos e netos, o meu singelo testemunho como homem que tenta ser o mais exemplar possível e os meus paupérrimos livros como alguém ligado ao Mundo de escrita.
Foi por volta dos 60 anos que percebi que estava a ficar... velho! O que é muito diferente de ser idoso. No entanto tanto para um como para outro não há uma idade definida. A não ser os diversos governos que cada ano vão acrescentando meses à nossa velhice. Nesta altura parece ser aos 66 anos e sete meses, mas pode ser que no próximo ano sejam mais ou menos meses! Ou anos!
Dito isto vamos ao que interessa!
Quando somos novos acreditamos piamente que seremos muito diferentes do que foram os nossos pais e avós. Temos outras visões da vida e acima de tudo do futuro, seja este próximo ou mais longínquo.
Só que o caminho da vida acaba (quase) sempre por nos levar a destinos tão diferentes dos imaginados que a determinada altura nem damos conta de como ali chegámos. É nesse instante que nos lembramos dos nossos antecessores e percebemos que se calhar eles tinham alguma razão nos avisos que iam dando e que nós olimpicamente olvidávamos.
Não fugi a esta matriz. Fui também rebelde, sensato, arisco, afável e mais não sei quantos adjectivos... Alguns bons e outros nem por isso.
Agora começa o tempo de fazer contas destes anos todos já consumidos. Do lado vermelho contabilizo os erros, as faltas, as minhas próprias e não assumidas pequenas e grandes hipocrisias. Do lado azul somo o empenhamento na ajuda aos outros, a solidariedade, os actos generosos que possa ter tido, para no final obter um saldo.
Contas apuradas restar-me-á apenas uma dúvida: se o saldo for negativo será que ainda posso ir a tempo de saldar as contas?
Hoje não vejo regularmente televisão. Mas nem sempre fui assim e há uma vintena de anos não havia transmissões de diversas plataformas, via internet. Deste modo via o que a RTP e os outros canais nos transmitiam.
No entanto foi nesse tempo que fiquei vidrado na série 24. Uma série de acção com diversas temporadas e que ganhou inúmeros prémios e donde sobressaiu como actor principal Kiefer Sutherland ao fazer de Jack Baur o invencível agente de uma unidade de Contra Terrorismo.
Hoje há certamente séries mais empolgantes que este 24. Algumas ainda tentei ver, mas depois lembrava-me deste 24 e das emoções que me provocou na altura e desliguei-me da televisão e das séries.
O mais engraçado é que neste momento ando a rever esta série, recuando assim 20 anos até àquelas quartas-feiras às 22 e 10 no canal 2 da RTP. Falta-me a minha companhia dessas noites: o meu filho mais novo!
Mas a vida é mesmo assim.
Termino com esta assumpção: gosto tanto deste 24 que ainda hoje mantenho no meu telemóvel o toque dos telefones da Unidade.
Já não me recordo onde li esta ideia: se tivesses que dar um título de livro à tua vida, qual seria?
Na altura não liguei a este mote para dias depois ficar a matutar no desafio. Só que foi com alguma facilidade que encontrei um rótulo para a minha vida já decorrida. Chamar-se-ia "Em contramão"!
Não quero com isto dizer que tudo o que fiz foi estar do lado contrário da vida, mas tenho consciência que fui diversas vezes apelidado de alguém que é do contra. Do contra talvez não, mas nunca fui subserviente, mesmo com quem estava acima de mim. Bastaria que eu tivesse razão e estaria logo a confrontar os outros.
Mas se recuarmos umas boas dezenas de anos, dou por mim na escola primária a ser o único aluno com óculos. Naquele tempo a oftalmologia era quase uma especialidade sagrada. Resultado fui brindado com diversos epítetos, nenhum deles famoso e feliz, e isso colocou-me logo do outro lado da barricada da vida.
A sorte náo estava do meu lado e os diversos professores que fui tendo na escola também não tinham aquela capacidade pedagógica para nos ensinar e ajudar a sermos melhores alunos e pessoas. Recordo a este propósito que certa vez uma professora de Geografia avisou-nos logo no primeiro dia de aulas: estou cá só para vos domar!
Achei terrível aquela afirmação e mais uma vez coloquei-me do lado contrário, olhando para os professores como gente pouco fiável. Resultado: esta postura fez de mim o homem que sou hoje. Não diria que seja um céptico, mas alguém que prefere questionar a aceitar de mão beijada tudo o que me surge na frente.
Obviamente com o 25 de Abril de 74 passei a estar do lado contrário da estrada da vida (só podia!!!), para muito mais tarde começar a entender que viver em contramão seria sempre um risco acrescido.
Os anos passam, a vida evolui e quando damos conta descobrimos, provavelmente até com graça, que conduzimos agora do mesmo lado da estrada, tal qual os outros.
Fica então outra questão em aberto: para quê viver em "Contramão"...
Nunca escrevi cartas ao Pai Natal e muuuuuuuuuuuuuuuito menos ao Menino Jesus que na minha altura de criança seria o responsável pela recolha da informação e mais tarde a sua distribuição.
Naquele tempo não havia super nem hipermercados e as lojas eram as da nossa rua; o senhor António da pastelaria, o Justino da papelaria, o Favinha da mercearia e alguns outros de quem olvidei o nome. Não havia distribuição gratuita e as prendas vinham pela chaminé enfiadas num cesto que alguém do lado de fora fazia descer.
A noite passada, mui perto da meia noite andei armado em Pai-Natal a distribuir os presentes pelos diversos sapatos deixados à beira da árvore de Natal. Notei que cada vez são menos prendas muito por culpa de alguns pais das crianças que apenas autorizam a entrega de uma prenda (leia-se brinquedo) por pessoa às suas crianças. Dizem que assim evitam desperdício.
Não sei se o conseguem, mas enfim, não pretendo contrariá-los. Talvez por isso a minha neta depois de abrir as suas poucas prendas dedicou-se a abrir as dos outros (as minhas incluídas!).
No fundo o prazer desta criança não parecia estar nos seus presentes de eventuais brinquedos, mas simplesmente no acto genuíno de desembrulhar as prendas, mesmo que fossem dos outros.
A minha (má) relação com o Natal tem origem numa triste estória que me aconteceu teria eu uns quatro ou cinco anos. Naquela noite o tal de "Menino Jesus" ofendeu-me, deixando uma marca que ainda hoje carrego. Obviamente que naquele tempo o "Pai Natal" não existia... pelo menos na aldeia!
O embaraço que eu criei com a minha zanga foi tamanho que a minha mãe teve de me dizer que as prendas eram as pessoas que as davam e não o tal "Menino Jesus". De decepção em decepção acabei por olhar para esta quadra que se aproxima sempre de viés, não fosse mais alguém pregar-me uma estúpida partida.
Todos os anos por esta altura sentia-me como peixe fora de água. Era um martírio que não escondia. No entanto a idade colocou alguma serenidade nesta bravata e passei a alinhar muito na ideia de que o célebre "Ventoínha" dos Parodiantes de Lisboa dizia: contrariado mas vou!
Foi preciso nascerem os filhos para que o Natal fizesse algum sentido. Não pelas prendas, mas tão-somente pela alegria que via nos meus filhos e sobrinhos.
Mais um passo em frente no tempo e dou agora conta dos netos. Daqueles fedelhos fantásticos que adoro e que me fazem olhar o Mundo com uns olhos diferentes.
É mais por eles que se faz ainda a árvore de Natal, (em 2008 quando morreu o meu sogro não se fez nada, porque ainda não havia crianças), se ilumina a casa por fora como se fosse um Circo qualquer, se procura aquela prenda, mesmo que os pais estejam contra.
O Natal não é só família e amigos...
O Natal não é só partilha e entrega...
O Natal não é só amor e alegria...
É essencialmente um bálsamo para as feridas na alma, um lenço que seca as nossas lágrimas, uma verdadeira reconciliação com o triste passado.
Durante muito tempo a minha relação com a fé e a igreja dependia do que os meus pais reservavam para mim. Neste sentido recebi quase todos os sacramentos: catequese, primeira comunhão, comunhão solene, escuteiros…
Numa fase mais adiantada da minha vida segui, qual ovelha desnorteada, os passos com quem convivia. E afastei-me da igreja, se bem que da fé… nem sabia bem o que isso era.
No entanto nunca fechei o meu coração à Palavra de Deus apenas fiz um intervalo (quase) sabático.
Acabei bem mais tarde por casar pela igreja, baptizar os meus filhos e dar a estes uma educação religiosa cristã, que eles mais tarde não pretenderam seguir.
Aproximei-me da fé cristã porque encontrei nela a paz que necessitava. Peregrinei muitos quilómetros e nos caminhos achei muitas respostas, mas assumi também muitas dúvidas. E ainda bem que assim foi pois tornou-se sinal de verdadeiro caminho de fé.
Há cerca de dois anos, na minha derradeira peregrinação a Fátima e em conversa com o padre que nos acompanhava decidi que havia um sacramento que me faltava e não gostaria de partir deste Mundo sem o receber. Falo do sacramento da Crisma.
Assim regressei recentemente à catequese, desta vez de adultos, para que com ela ou nela encontre novas respostas ou quem sabe mais dúvidas.
Diria que Deus lá saberá, na Sua infinita sabedoria, do que eu necessito realmente.