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Espaço de reflexões, opiniões e demais sensações!

Espaço de reflexões, opiniões e demais sensações!

Uma lição!

Há muitos, muitos anos conheci na aldeia um homem sui generis, mesmo para aquela época. O nosso primeiro encontro foi na estrada quando eu, um rapazola ainda muito imberbe, passava os dias rua acima rua abeixo na minha bicicleta. Como andava sempre a "assapar" certa vez quase me esbardalhava contra o seu enorme rebanho de cabras. Pedi-lhe desculpa, mas aquela figura do ti' António Costa chamou-me à atenção. Já muito entrado na idade, percebi-lhe na voz uma certa deficência: era fanhoso!

A verdade é que esse foi o nosso primeiro diálogo. Alguns outros se seguiriam, poucos, mas de um deles ficou uma lição de filosofia para a minha vida. Quiçá a primeira e que anos mais tarde consegui claramente entender.

O ti' António era um pobre homem a quem ninguém lhe conhecia amizades, mas ele também não as favorecia. Nunca ia à taberna e se alguém por acaso o convidava para beber um copito, ele respondia:

- Não vou, depois queres que pague eu...

Se insistiam lá ia, mas escutava logo um assobio colectivo:

- O ti' António na tasca? Quem será o desgraçado?

Na verdade o velho pastor vivia numa casa que mais parecia um pardieiro. Não tinha água, nem casa de banho e muito menos electricidade. O que comia poucos sabiam, mas não deveria variar muito de batatas, tomates ou feijão que ele fazia questão de cultivar.

Um dia percebi que o seu parco rendimento financeiro advinha da venda do leite a uma cunhada e de alguns cabritos e cabras mais velhas, para o talho. Mas se recebia pouco, também era verdade que não gastava uma moeda.

Das últimas conversas que tive com ele e perante a minha insistência sobre o que fazer com o dinheiro ele deu-me esta lição:

- Quem te dera a ti, meu rapaz, gostares tanto de estrafegar o teu dinheiro, como eu gosto de poupar o meu!

Esta frase que na altura entrou a 100 e saiu a 200, só muitos anos mais tarde, como já observei acima, se tornou numa assumida filosofia de vida.

Transportada para o dia de hoje aquela frase traduz com uma simplicidade quase absurda o que deveria ser a nossa vida: fazer unicamente o que gostamos, sem termos vergonha nem receio.

Ti´António foi encontrado morto por uma irmã, no chão imundo da casa, rodeado de todo o género de bicharada peçonhenta.

Nunca ninguém falou se encontraram dinheiro.

Sempre a aprender!

Hoje de manhã cedo reparei que um fio electrico ou similar desprendera-se de um poste telefónico.

Estiquei-o de forma a não atrapalhar quem ali passasse se bem que fosse no sentido da estrada, mas mesmo assim preferi arranjar uma meia solução e prendi o fio ao meu gradeamento.

Agora cabia-me tentar perceber a quem pertenceria o dito cabo. A minha primeira ideia foi ligar para os Bombeiros a quem contei o sucedido. Daqui recebi a simples indicação que não era com eles já que não estava ninguém em perigo. 

Passei para a EDP. Daqui conseguiu-se que um piquete passasse na rua, mas logo se percebeu que também não era com eles. Faltavam as operadoras de telefone e televisão.

Fui ao motor de pesquisa e coloquei "avarias na via pública telefones", mas a única coisa que encontrei foram uma série de números de telefone (alguns de tarifa mais cara) todavia sem a indicação de avarias.

Vali-me então dos meus conhecimentos e liguei para um amigo que tem uma filha que trabalha numa operadora. Uma par de horas mais tarde pararam à minha porta duas carrinhas com escadas e em menos de nada resolveram a situação já que o cabo era mesmo deles.

Aproximei-me e a uma distância segura agradeci a rapidez e perguntei como deverei fazer em futuros casos, até porque poderá ser um outro cabo de uma outra empresa.

Resposta pronta do técnico:

- Corte o cabo, verá que em menos de cinco minutos alguém aparece.

Decididamente sempre a aprender! 

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