Neste mesmo dia mas em 2017, portanto há meia dúzia de anos, estava em Fátima, na Cova da Iria nas comemorações do Centenário das Aparições.
Entre milhares de peregrinos presentes no recinto houve um que se destacou: o Papa Francisco. Um homem de fé, mas outrossim de cultura, conhecimento, racionalidade quanto baste e coragem.
Porém do dia 12 e 13 des te mês de Maio de 2017 guardo uma frase que emocionou os fiéis presentes e obviamente o Mundo, especialmente o Católico. Na homília da missa que consagraria os irmãos Francisca e Jacinta como santos da Igreja escutei o Papa dizer: temos Mãe!
Duas palavras que transbordam de realidade. Duas palavras que acrescentam à nossa vida um peso e uma consciência de finitude.
Uma Mãe que é omnipresente na vida de todos nós, que não vemos, não a sentimos fisicamente, mas que está sempre lá!
Partirei amanhã de madrugada para a peregrinação de 2022. Após dois anos sem direito a tal é com um misto de alegria e algum receio que amanhã de madrugada, partirei para Fátima a pé.
Serão aproximadamente 150 quilómetros entre muita gente (menos do que é costume), muitas estradas, caminhos e trilhos. Muita fé no coração, mas sempre com a certeza que Deus e Mãe Santíssima velarão por nós.
Prevê-se tempo quente para estes dias. Demasiado quente se bem que as manhãs sejam já bem frescas. Veremos como correrá!
Nestas horas que me restam até à partida tento reposicionar-me mentalmente para aquilo que posso a vir a ter necessidade nos próximos dias, se bem que não seja a primeira vez que peregrino há sempre aquilo que nos esquecemos.
Para quem por aqui fica, tenha um óptimo fim de semana. E se porventura forem crentes rezem por nós. Também necessitamos.
Eu pelo caminho rezarei certamente por todos vós, crentes e não crentes!
Irei, na medida do possível, tentar escrever alguma coisa sobre a caminhada. Mas se não virem nada publicado não se admirem... é porque não tive rede ou fiquei sem bateria no telemóvel.
Na Cova da Iria, neste dia tão santo para os católicos, os peregrinos não estiveram, mais uma vez, presentes. Nem ontem à noite na célebre Procissão das Velas.
Um recinto vazio de pessoas, mas repleto de profunda fé.
Foi na casa de cada um de nós, que peregrinamos muitas vezes até Fátima e na vida, que ontem a luz se tornou realidade. À janela, nos nossos corações, no espirito cristão que nos acolhe em cada passo.
Aqui morou e ainda mora a esperança de um novo dia… mesmo sem ninguém!
De hoje a um mês estarei a chegar de mais uma peregrinação. Entretanto realizou-se esta tarde a reunião habitual de apresentação de toda a equipa da organização.
Seremos ao todo 110 peregrinos, contando obvimente com os elementos de apoio.
Por aquilo que me foi dado costactar irão muitos jovens (ainda bem, é necessário dinamizar a juventude para estas experiências), muita gente pela primeira vez e também muitos peregrinos já conhecidos de anteriores peregrinaçães e porque não dizê-lo se tornaram bons amigos.
É uma dádiva enorme estar inserido num grupo destes, dispostos a "orar com os pés", como descreveu um dia um amigo do cardeal Tolentino de Mendonça, ao referir-se a uma peregrinação em que participara.
Começa hoje, assim, uma espécie de contagem decrescente até chegar à madrugada do dia 4 de Abril.
É que há muita coisa para preparar.
Acima de tudo o espírito. É que isto de nos pormos a caminho tem muito que se lhe diga!!!
A pergunta que titula este texto foi-me formulada há muitos anos por um colega, assumidamente ateu, após uma das primeiras peregrinações que fiz a Fátima. Na altura não encontrei resposta devida.
Entretanto nestes próximos dias as estradas portuguesas enchem-se de peregrinos de coletes amarelos e fluorescentes vestidos, com o único intuito de chegar ao Altar do Mundo, onde encontrarão a sua fé personalizada em Nossa Senhora.
Vêm de todo o lado, arrastando-se muitas vezes por estradas assaz perigosas e caminhos sinuosos. E tudo para estarem presentes naquela noite de 12 para 13 de Maio na Cova da Iria.
Muitos caminharão por promessa, outros como meros acompanhantes de outros peregrinos e haverá mesmo os que andarão por puro turismo religioso, que ainda estou a tentar perceber o que é…
Peregrinar é pôr-se a caminho. Num caminho que é obviamente de fé, mas também de esperança e alegria. Fé num mundo melhor, numa sociedade mais justa, numa vida com maior sentido. Esperança na aceitação dos nossos próprios temores e das nossas dúvidas. Alegria por encontrar no regaço de Mãe Santíssima o local perfeito para ali colocar os nossos ensejos e as nossas dedicações.
Regresso à pergunta inicial: porque peregrinas? A resposta é fácil agora… Porque enquanto caminho encontro Deus nos mais singelos pormenores ou nas mais belas paisagens campestres.
Saímos de Minde cedo como nos outros dias. Previam-se 17 quilómetros até à Mãe Santíssima, quase sempre em estradas de terra batida, para terminar em alcatrão.
O caminho fazia-se devagar tal era o esforço da maioria dos peregrinos ao fim de quase 150 quilómetros. Acabei esta minha viagem a conversar com o Padre J. que me escutou... escutou... escutou...
É preciso ser-se um enormíssimo pastor para conseguir levar este rebanho pelas estradas, em busca do consolo de Virgem Maria.
Uma peregrinação não pressupõe somente andar... Há nesta opção, que nos é tão familiar, um misto de sentimentos, onde o espírito de sacrifício de cada peregrino, a teimosia, a persistência e a verdadeira fé se conjugam numa espécie de mistura rica, muito bonita e assaz sensível.
Chegou-se à Cova da Iria ainda antes do almoço. Coletes amarelos entregues, surgiu então uma mancha laranja, já que cada peregrino foi brindado com um bonito camisolão, referente a esta peregrinação. Rezámos o terço ainda antes de entrar no santuário. Por fim...
Ao centro a velha Basílica, para do lado esquerdo se observar a Capelinha das Aparições. Fomo-nos aproximando em silêncio. Um silêncio que teve o condão de fazer despertar muitas lágrimas. Duzentos metros.... cento e cinquenta... cem...
A cadência dos passos é sempre a mesma. Ninguém corre nem recua. Há ali uma atracção serena por aquele espaço.
Cinquenta metros... trinta... vinte. Há quem olhe para aquela mancha colorida de forma estranha. Outros mais habituados, nem ligam.
Por fim a imagem de Nossa Senhora envolta numa redoma de vidro, ali a aguardar por todos nós. Pelos nossas dores, aflições, desejos e orações. São torrentes de lágrimas sentidas, choradas com fervor, partilhadas com os outros peregrinos.
Veio o almoço seguida da eucaristia onde a homília foi quase toda substituída por partilhas dos que viveram esta aventura. A maioria dos que falaram foi a primeira vez que peregrinaram!
Peregrinar resume-se neste permanente dar de mão, naquela questão ao que caminha sozinho "estás bem?", nas muitas horas de partilhas nos chãos desses pavilhões, dos banhos mal tomados.
Peregrinar é assim tudo isto e muito, muuuuuuuuuuuuuuito mais.
O problema é que tivemos de atravessar uma serra íngreme e que não foi fácil.
A bem da verdade esta madrugada não foi um grupo de peregrinos que saiu das Fráguas mas um grupo de "zombies", tal a forma como todos estavam ao fim de 90 quilómetros.
Após laudes e reforço alimentar eis que entramos numa aldeia a rezar a via sacra. Textos duros. Muito duros que deixaram muitos peregrinos a chorar.
As palavras de uma mãe que vê o seu filho a ser crucificado na cruz não são fáceis. Nem de ouvir e muito de dizer, especialmente por uma mãe.
Mas a peregrinação é tudo isto: um misto de alegria da caminhada em Cristo e a consciência da paixão de Jesus.
Amanhã chegaremos a Fátima.
E teremos Mãe Santíssima à nossa espera.
Adenda: A eucaristia de hoje decorreu, já muito tarde, no recinto onde os peregrinos dormiram, numa profunda demonstração de como Jesus Cristo está em todo o lado.
Acordamos novamente muito cedo. Ainda por cima a hora mudara...
Tralha arrumada, pequeno almoço tomado e eis-nos a caminhar debaixo de uma chuva miudinha e muito, muito fria.
Mas peregrino que se prese não se atemoriza com a intempérie e parte para o caminho repleto de coragem e fervor.
Onze quilómetros palmilhados e parámos em Sobral de Monte Agraço, onde numa pastelaria confortámos o estômago com cafés e pastéis de feijão. Uma delícia...
Depois a oração das laudes rezadas em conjunto. O almoço seria a próxima paragem.
Pelo caminho surgiram as primeiras questões formuladas pelo padre J. A nossa alma começa a perceber que nem tudo é como gostaríamos. E que a fé advém da palavra.
Ficou então no ar uma questão: qual a palavra que define a nossa fé?
Temos mais 90 quilómetros para encontrar a resposta.