Neste postal escrevi a minha singela homenagem, infelizmente póstuma a um amigo de infância. Ontem fui ao seu velório que é sempre uma coisa fantástica para terminar o fim de semana. Mas ele não foi culpado e eu também não me sentiria bem se ficasse em casa.
Muita gente presente, mesmo muita gente. Especialmente amigos e colegas da Marinha onde serviu muito tempo nos submarinos.
Cumprimentei a família, apresentei as minhas sentidas condolências e deixei-me ficar ali num perfeito anonimato, não fosse a "Ceifeira" ver-me e considerar-me um potencial candidato.
Sei que todos somos elegíveis, mas ainda gostaria de fazer algumas coisas antes de ir "desta para melhor"! Porque tenho pais, filhos e netos e muita escrita ainda para publicar.
O meu primeiro dia de prais foi no sábado passado. Que até teve direito ao filmezito da ordem.
Pouca gente, se bem que por aqui a época balnear já tenha iniciado pois vi as praias por onde passei já devidamente apretechadas de banheiros salva-vidas, bandeiras indicadoras de acesso ao mar e até polícia marítima.
Porém o vento matutino não deixava grande vontade de ficar na arei. Assim nada melhor que uma caminhada à beira-mar. A água estava normal para esta altura do ano, diria mesmo que menos fria que os outros anos.
O meu regresso a este encontro é sempre feito com emoção. Gosto do mar. Adorava ter sido marinheiro. Mas a vida deu-me outro fado.
A vida é uma enorme professora que constantemente nos dá inúmeras lições. Na verdade não temos nada como garantido a não ser o nosso passado e um dia a negra!
Tudo o resto não passará de vontades e desejos.
Há que reconhecer que de um momento para o outro tudo tudo pode mudar. O que agora parecia firme passa a frágil e este a firme. A pandemia tem sido, para todos, um enorme exemplo disto.
Hoje um familiar muito próximo sentiu-se mal e teve de ser internado de urgência. Não se sabe o que teve, talvez durante a noite se saiba alguma coisa.
Ainda antes de tudo acontecer almoçámos, conversámos e rimos juntos. Aliás como diariamente o fazemos!
Porém de um momento para o outro tudo mudou. Para pior...
Como escrevi no início... a vida é uma enorme professora! Mas há quem julgue que está acima dela.
Tão tramada que num dia que poderia ser de festa, uma notícia terrível entrou-me pelo telemóvel dentro.
Todos nós somos filhos, alguns pais e mães. E por isso os descendentes devem ser a normal continuação dos pais, com as naturais diferenças de idades e pensamentos.
Deste modo, e se a lei da vida fosse cumprida sem excepções, caberia sempre aos filhos enterrarem os pais.
Só que infelizmente a vida prega-nos partidas. E daquelas impensáveis...
Porque a morte nunca é uma boa notícia. Ainda por cima se envolver a filha de um dos nossos amigos.
O dia perdeu então toda a sua luz. E a tristeza envolveu-me.
E agora que dizer? Apenas que a coragem invada o coração deste meu amigo!
Porque já são tantas as (más) partidas com que a vida o vem brindando... que nem imagino como estará o seu coração.
Um dia perguntaram-me que faria se me saísse o Euromilhões?
Respondi que a mim jamais sairía tal prémio porque não jogo. Mas se um dia tivesse a infelicidade de me sair um valor estupidamente grande, assumo já aqui que não faria rigorosamente nada.
Ou melhor... manteria o meu dia a dia. Faria as mesmas compras, gastaria o mesmo dinheiro, não mudaria uma vírgula que fosse à minha vida.
Já não tenho idade para realizar grandes feitos. Se o dinheiro que saísse me desse a visão na vista esquerda e a audição no ouvido direito, aí sim gastaria-o de bom grado. Agora como tudo isso é irreversível...
Há trinta e cinco anos um amigo e colega de trabalho ganhou o 1º prémio da Lotaria Nacional. Fui com ele nesse mesmo dia ao Banco depositar o jogo com receio de ser assaltado. Passado pouco tempo desempregou-se e foi viver dos rendimentos. Só que...
... nem tudo foram rosas. Ou se foram tiveram outrosssim muitos espinhos. Este meu amigo comprou então um carro que era uma verdadeira bomba. Mas uma noite em viagem despistou-se e de todos os passageiros foi ele o que sofreu menos. Até houve mortes.
Penso sempre neste caso quando me falam em jogos de fortuna e azar. Eu já jogo um que é deveras perigoso... chama-se o jogo da vida. As regras estão quase sempre a mudar e jamais sabemos se ganhámos ou perdemos.
Nunca mais soube daquele meu amigo. Mas provavelmente, se pudesse voltar atrás, tenho a certeza que jamais jogaria qualquer espécie de jogo.
Estas linhas poderiam ser o mote para uma dissertação filosófica mas é apenas e só, um desabafo. O mundo como agora se vai constituindo cria uma espécie de seres humanos, que de humanos têm muito pouco, Tal qual os abutres vivem e sobrevivem sobre os cadáveres dos que atropelaram, dilaceraram, magoaram.
Esquecem-se que um dia também eles passam a ser presas. Olvidaram o emaranhado que criaram e acabam também um dia por tombar aos pés de outros.
Para gáudio dos novos adversários e dos inimigos que no caminho foram criando.