Alguns dos leitores perguntar-se-ão: o que fez este lisboeta regressar às origens?
A questão faz todo o sentido visto à distância. Todavia para mim que sempre gostei do campo, regressar à aldeia que não me viu nascer mas viu-me crescer e pegar naquelas nacos de pedras salpicadas aqui e ali por um pedaço de terra é sentir que faço parte daquele mundo.
Mas há mais… Em 2005 a aldeia foi quase toda consumida pelas chamas. Só ao meu pai arderam centenas de oliveiras, velhas é certo, mas ainda assim produtoras de uma azeitona negra e luzidia.
Com os incêndios dos últimos anos achei que seria tempo de pegar nas fazendas e limpá-las de mato e do muito lixo largado por anónimos.
Entretanto nasceu essa autoridade chamada PDR2020 que parecia destinada a distribuir dinheiro a rodos. Falei então com uma empresa especializada que, “in loco”, avaliaram e orçamentaram o custo dos trabalhos de limpeza dos terrenos. Apresentei então um projecto àquela entidade, de forma a ser ressarcido em parte dos gastos que iria fazer. O valor em causa rondaria os onze mil euros, dos quais receberia, se tudo corresse bem, 85%. Achei que a coisa tinha pernas para andar e candidatei-me. Ou melhor… candidatou-se o meu pai pois que não obstante eu ser filho único, as fazendas ainda estão em nome dele.
Em janeiro de 2016 foi apresentada a dita candidatura para a medida 8.5 - Melhoria da Resiliência e do Valor ambiental das Florestas que obteve a aprovação e uma nota final, somados todos os critérios, de 12,5 valores.
Faltava finalmente aguardar pelo dinheiro. Entretanto coloquei a empresa a fazer os trabalhos que duraram dois longos meses. No chão ficou a lenha e os sobrantes da intervenção. Durante alguns fins-de-semana andei por lá a queimar rama cortada.
No dealbar dos anos cinquenta Portugal era um país pobre e isolado do resto do Mundo. A Segunda Grande Guerra havia terminado meia dúzia de anos antes e enquanto a Europa se reconstruía o nosso pa´ís vivia ao mesmo ritmo de anos anteriores. Por isso muitos portugueses começaram a sair das suas aldeias em busca de melhor vida.
O meu pai foi um desses casos. Em 1953 é chamado para o SMO (Serviço Militar Obrigatório) e de repente percebe que o seu futuro poderia estar ali. Quando ingressou na Marinha de Guerra Portuguesa deixou para trás anos a calcorrear caminhos e veredas atrás das cabras, semanas seguidas a cavar a terra ou dias a mondar o milho.
Na tropa tinha um tecto, com um boa cama em vez do monte de palha, roupa limpa em vez dos trapos velhos herdados sabe.se lá de quem e sapatos todos janotas em vez de uns enormes "alguidares" que só usava para ir à missa, por obrigação do pai, em vez do irmão mais velho.
Esteve muito tempo ausente da aldeia e quando regressou foi para casar e voltar à cidade. Outros irmãos também optariam por partir da aldeia em busca de nova vida. E assim dos sete filhos do meu avô, apenas três ficaram na aldeia e destes apenas um tomava conta das fazendas. Assim depressa o meu avô se libertou do gado caprino.
Morreu ainda novo deixando então aos filhos uma herança em fazendas. Com tanta gente ausente estas depressa passaram a ficar abandonadas e nelas começou a nascer naturalmente uma floresta. Desordenadamente!
Foi necessário decorrer quase meio século para que eu, herdeiro único de meu pai ainda vivo, pusesse mãos à obra e passasse a tomar conta daquilo que fora abandonado pelo meu antecessor.
Visitei então as fazendas onde nalgumas delas nem consegui entrar tal era o mato e o arvoredo que cresciam espantaneamente. Algumas oliveiras tinham o tamanho de autênticos sobreiros lutando com pinheiros, eucaliptos ou carrascos (vulgo azinheira) por um naco de luz solar. E nelas investi dinheiro e muitas, muitas horas de trabalho.
Pois... eu regressei às origens e apostei no amanho das terras...