Neste mesmo dia há precisamente três anos despedia-me virtualmente dos colegas do trabalho, pois ia entrar de férias para logo a seguir passar à reforma.
Segue infra a mensagem que enviei na altura aos meus colegas. Não enderecei a todos porque, sinceramente, ao fim de mais de trinta e cinco anos já conseguia separar o trigo do joio. E alguns nem a água que gastavam mereceiam. Mas isso foram outras estórias que hoje aqui não interessa.
Esta foi a mensagem que escrevi e que depois de a reler, mesmo depois de passados estes anos, não retiraraia uma vírgula.
"Boa tarde,
ONTEM fui um jovem que aos 23 anos abraçou o desafio de entrar nesta casa. Quase inocente e ingénuo estava, ainda assim, muito longe de imaginar como é que aquele passo, no já longínquo dia 6 de Outubro de 1982, quando entrei pela primeira vez no 148 da Rua do Comércio, viria a influenciar a sua vida.
HOJE sou um homem maduro. Daquele menino de ontem resta muito pouco ou quase nada. Entrei solteiro, mas por aqui casei, fui pai e avô. Quem diria? Nem eu, nos meus sonhos mais optimistas, calculei aqui chegar. Mas saio desta casa de cabeça erguida, consciente que trabalhei não para uma instituição, mas essencialmente tentei defender uma causa. Retiro-me por isso feliz. Muito feliz.
AMANHÃ acordarei igual ao que sempre fui até aqui: um amante da vida. Não imagino se viverei um dia, uma semana ou uma década. Mas também não é algo que me preocupe grandemente. Viverei apenas o segundo seguinte sem medos ou dúvidas. Nem poderia ser de outra forma.
FINALMENTE vou-me despedir. Sem lágrimas nem sorrisos. Sem amplexos nem osculações. Esta pandemia retirou-nos, outrossim, estes pequenos e singelos prazeres. Mas é a vida!!!
QUERO no entanto deixar aqui um agradecimento profundo e autêntico pelo contributo que deste pela forma com que saio desta casa. Não o posso nem devo esquecer!
AO fim de 37 anos, 9 meses e 25 dias, a porta onde entrei tem o mesmo sentido de hoje. O do dever cumprido.
DESEJO que o teu futuro seja tão radioso quanto tu esperas e desejas. E que no fim da tua caminhada possas também viver a alegria que hoje vivo.
OBRIGADO."
Decorrido 36 meses continuo a pensar que fiz bem em sair. Tenho os meus dias preenchidos, a vida repleta de eventos (bons e maus!), alguns sonhos realizados, mas muitos ainda por realizar.
A vida acaba sempre por nos mostrar quais os resultados das nossas decisões. Independentemente do que possa acontecer num futuro mais perto ou mais longe, ainda não arrependi de ter saído.
Talvez amanhã penso o inverso, porém ainda não cheguei lá!
Faz hoje 43 anos que principiei oficialmente a trabalhar. Escrevi oficialmente porque foi o dia em que entrei para uma empresa onde comecei a descontar para a minha reforma e outrossim a pagar os meus impostos, como era na altura o imposto profissional!
Desde esse dia até 31 de Julho de 2020 estive 5 dias desempregado, quando saí desta empresa e me transferi para o Banco de Portugal.
Mais de 40 anos a trabalhar, a dedicar-me de alma e coração aos desafios que me foram surgindo, a tentar responder com competência ao que me era solicitado.
A verdade é que passamos tantos anos a trabalhar que nem damos conta como a vida correu célere, como envelhecemos, como fomos angariando algumas dores… Mas também algumas alegrias, amigos, venturas.
Hoje regressei a mais um almoço com antigos colegas. Nem me recordo quantos eram à mesa, mas certamente mais de uma dúzia. Cheguei atrasado o que nestas ocasiões é sempre bom porque o último a chegar dá um aceno geral e estão todos cumprimentados.
Revi gente que já não via certamente há uns bons anos. Especialmente porque optaram por ir para o BCE e quando regressaram já eu estava reformado.
Já na rua a festa continuou… Foi o momento dos cumprimentos e das despedidas. Dos abraços e dos ósculos às senhoras.
Senti-me bem… Muito bem mesmo! Acima de tudo porque ainda não fui esquecido pelos antigos colegas. Como ser humano o pior que me poderia acontecer é ser olvidado ou ser apenas uma cinza na memória. Doer-me-ia!
Há 40 anos quando estava a poucas semanas de ingressar num novo trabalho, um tio próximo deu-me o seguinte conselho: toma cuidado como entras na empresa, já que a primeira imagem que deres aos teus colegas será aquela que irá perdurar para sempre.
Fiquei um tanto apreensivo, mas depressa percebi quão verdade havia sido aquele aviso, já que anos mais tarde alguns dos colegas que tinham entrado comigo no mesmo dia receberam outros desafios, enquanto eu me mantinha no meu local de trabalho original.
É certo que jamais usei de subterfúgios para alcançar outros cometimentos, como alguns usaram. Nunca foi do meu feitio pois sempre gostei de ser sério... comigo mesmo. De pouco me valeu esta postura já que muitos ultrapassaram-me pela direita e pela esquerda, enquanto mantinha o mesmo caminho. O dinheiro para mim não é tudo, nunca o foi, e a minha consciência tinha e tem muito mais valor que uns meros euros a mais no fim do mês.
Talvez por isso (ou provavelmente não!) ainda hoje sou recordado por antigos colegas com quem trabalhei, não obstante já estar reformado há dois anos. De tal forma que marcaram um churrasco e convidaram-me para fazer parte do convívio. Podiam perfeitamente não o ter feito, já que não têm qualquer obrigação para comigo.
Tudo isto para dizer simplesmente que a vida também nos dá alguns prémios. Não serão Óscares “hollywoodescos”, mas ainda são prémios. E boooooooons!
Fica por dizer, porque nunca o soube, qual foi a imagem que os colegas tiveram de mim naquele dia de Outono, há 40 anos.
Ontem regressaram os almoços de antigos colegas de trabalho.
Após dois anos de ausência eis que nos encontrámos, mais uma vez, decorrido que foi este longuíssimo tempo. Mais velhos, obviamente, mas ainda assim com bom aspecto tendo em consideração a idade da maioria (quase todos são mais velhor que eu!). Senhoras incluídas!
Retirando dois casos está tudo reformado, vivendo os dias naquela aposentada calma que se deseja e merece. Pois... mas eu nada referi sobre os meus preenchidos dias. Para quê? Provavelmente nem acreditariam.
Mas o que melhor me soube deste repasto foi ter almoçado nas calmas sem aquele stress de quem tem horários a cumprir, algo impensável enquanto elemento activo.
Combinou-se entre todos novos almoços, falta agora marcar o dia e o local!
Termino dizendo que todos tinham máscaras. Não vá o Diabo tecê-las!
Se tudo correr como espero e desejo de hoje a 15 dias entrarei de férias que antecipam a minha reforma.
Talvez por isso iniciei hoje um périplo virtual por alguns colegas que ainda ficarão na empresa, no sentido de lhes agradecer de forma pessoal, se bem que ao longe, a amizade e disponibilidade que me dispensaram nos últimos 37 anos.
Tenho consciência perfeita que num futuro nunca farei falta. Somos realmente apenas números e nomes e pouco mais. E ninguém é insubstituível... Mas, ainda assim, prefiro dizer "até sempre" ou somente "obrigado" a quem me ajudou e a quem eventualmente também terei ajudado.
É a minha forma de estar na vida. Ser grato é para mim uma enorme virtude que gosto muito de alimentar. E de ser alimentado... também!
Provavelmente esquecerei muitos colegas, mas talvez para evitar isso comecei com algum tempo a enviar algumas mensagens de correio electrónico.
Sinceramente nem quero respostas apenas que saibam quão grato eu fiquei com eles.