Na minha cidade XIV - Simpatia pura!
São pouco mais que dez da manhã. Saí na estação do Metro do Colégio Militar onde vou visitor o meu pai no hospital e entregar-lhe o jornal, como tenho feito nos últimos dias.
Ao cima das escadas, ainda antes dos pórticos de saída, encontra-se um invisual. Percebo que está um tanto desorientado tal a confusão de indicações que algumas pessoas do lado de fora vão dando ao cego.
Já escaldado com algumas más experiências com cegos ainda assim avanço:
- Necessita de ajuda?
- Quero ir para o Centro Comercial.
- Mas tem de passar as cancelas...
Ao mesmo que digo ajudo-o a encaminhar-se para uma saída de sinal verde. Coloca o passe, as portas abrem-se e ele passa com calma. Sigo atrás.
Vira à direita mas por pouco bate numa coluna. Ajudo:
- Cuidado que está aí uma coluna. Quero que o leve até ao CC?
- Havia aqui um quiosque onde se podia comer... - diz sem sequer escutar a minha indicação.
Olho em redor e não percebo qualquer loja. Todavia...
- Para este lado do CC não há. Só se for para o lado das paragens de autocarro.
- É para aí é!
- Quer que o leve?
- Agradeço.
Ando meia dúzia de metros e encontro logo uma pequena loja.
- Está aqui um quiosque... Quer vir aqui?
- É esse mesmo.
Endereço-o para lá com o braço.
- Cuidado com o degrau.
E num ápice:
- Está cá a Paula?
Por detrás do balcão está uma senhora alta, robusta mas simpática. Em tom de brincadeira vou dizendo:
- Este senhor quer um copo de três... tinto.
Ela responde:
- Só favaios!
- Ela é a minha madrinha! - diz o cego.
- Ai sim?
- Arranjei noiva e ela vai ser a madrinha...
A outra ri, mas preciso de me despachar.
- Um abraço e um fantástico 2019 - desejo eu.
- Se 2019 for igual ao fim de 2018 vai ser um ano muito bom. Não quer beber nada?
- Obrigado, mas não. Agora não! Felicidades.
Dou um aperto de mão ao cego que me retribui com vigor e regresso ao caminho.
Começou bem o meu dia. Finalmente um cego repleto de simpatia pura.