Estranho "Reveillon"!
Quando era jovem gostava muito dos fins de ano. Seria assim uma espécie de contra ponto do Natal pelo qual não nutria uma admiração por aí além. Mas isto já vocês sabem!
O que desconhecem é que certo ano fiz a passagem de ano... num autocarro da Rodoviária Nacional.
Pois foi, não terá sido uma passagem assim... fantástica e foi nessa noite que percebi que as passagens de ano só serviam para gastarmos dinheiro a rodos, beber que nem uns desalmados e sem qualquer proveito para o ano que chegava.
A culpa obviamente não foi minha. Eu e a minha troupe tinhamos combinado juntarmo-nos numa certa hora em determinado lugar para irmos para uma festa cujo lugar desconhecia.
O problema prendeu-se com o próprio dia 31 pois era o dia em que a administração descia à terra e vinha dar a volta às casas-fortes da tesouraria. Notas, moedas, barras de ouro, ouro amoedado tudo era visto, analisado e conferido.
Nesse dia 31 às 15 horas fecharam-se as caixas e apuraram-se os saldos de forma a fazer-se a entrega o mais rápido possível pois todos sabíamos das tais vestorias administrativas e que demorariam muito mais do que queríamos e desejavamos. Tudo estava a correr com alguma normalidade quando alguém diz que o balanço geral tinha uma diferença de centavos.
Primeiro pensou-se que era brincadeira para logo a seguir evoluirmos para outra triste realidade. Havia realmente uma diferença, mas que era apenas escritural, não envolvendo dinheiro e consequentemente casas-fortes. Assim deu-se seguimento ao encerramento daquelas, após conferência dos valores fiduciários, ficando apenas a equipa final de balanço. Claro que eu, como maçarico e ainda por cima solteiro, tocou-me essa fava de ficar a trabalhar.
Portanto toca a pegar em centenas de papéis e conferir cada lançamento, para logo a seguir conferir a soma e mais tarde perceber se os dados na folha central estavam correctos.
Como devem calcular o tempo naquela altura correu contra mim. No meu velho relógio de pulso ia dando conta do tempo que ainda teria para me despachar. Com as horas a passarem, a certa altura estive na disposição de alugar um táxi para me levar de Lisboa à margem Sul, onde residia para buscar coisas para levar para a festa.
A certa altura tirei o relógio do pulso e guardei-o tal era a ansiedade que tinha em ver o tempo a fugir.
Oa papéis eram esmiuçados ao pormenor sem grandes resultados. Note-se que a diferença resumia-se a... 6 centavos de escudo, quando na altura a moeda mais pequena eram 10 centavos. Mas não se poderiam fechar as contas com esse erro. Jamais.
Não fui eu que encontrei o erro, mas um chefe que depressa desembaraçou o novelo e meia-hora depois estávamos todos na rua.
Eram 10 e meia da noite e assumindo que teria o meu "Reveillon" estragado, segui calmamente até ao velhinho Cais do Sodré onde apanhei o barco das 11 da noite.
Já em Cacilhas tomei um autocarro que me deixou perto de casa já depois da meia-noite. O curioso é que naquela viagem com pouquíssimos passageiros ninguém saudou o Ano Novo! Nem o próprio condutor!