Ver e sentir
Há momentos na nossa vida que são marcantes: o primeiro beijo numa namorada, a primeira noite fora de casa, a primeira volta de carro após exame de condução, o primeiro filho e tantas outras “primeiras” coisas…
Cada vez menos se dá importância a gestos singelos. Um sorriso, um abraço fraterno, uma chuva miudinha, o voo de uma ave, o ranger de uma árvore...
Num destes dias, estava de férias na serra da Gardunha, quando me surgiu um problema na vista direita. Os sintomas descreviam um descolamento da retina. E tendo em conta que o olho esquerdo já fora vítima de um mesmo problema assustei-me deveras com a situação, regressando a Lisboa rapidamente.
Curioso é que nessa tarde, enquanto esperava que me trouxessem para a capital, comecei a reparar em coisas que jamais me apercebera. No fundo da escada de mármore da minha casa, pequenos animais lutavam por um ínfimo naco de comida; as folhas castanhas que caíam á força do vento outonal tinham uma beleza estranha; os campos transpiravam água negra de terra fértil.
E nada disto teria observado se não pensasse que poderia ficar sem ver…
Mas tudo não passou de um valente susto. Tratado, visto e revisto, estou quase como novo.
Não fiquei a ver mais, mas vejo melhor…