Houve tempo em que olhava para trás na minha vida e só via defeitos e asneiras. Ou fora na vida escolar ou noutra qualquer, encontrava sempre um momento menos bom.
Só que a vida tem também coisas simples e de uma penada dou por mim a rever uma vez mais o meu passado e encontrar nele, finalmente, algo de interessante.
Fiz muitos amigos, ajudei muita gente, assumi algumas batalhas, que sendo de outros, fi-las minhas. Tentei ser um bom exemplo para os vindouros.
Aproximam-se dias diferentes. Momentos que considerarei estranhos para não dizer bizarros.
Aceito o meu destino. E sempre, sempre com um sorriso.
Uma obra da qual tenho sido o seu principal autor e obviamente leitor, ao mesmo tempo e numa mesma importância de valores.
Mas esta obra ainda não está totalmente escrita. Falta o epílogo e esse, tal como o restante livro, ainda vai ser vivido para ser transcrito.
Há uns anos pensava eu que ao terminar este capítulo ou outro qualquer sentisse uma espécie de mágoa e tristeza. Curiosamente não senti nada disso e fechei a última página de forma serena.
A vida é muito engraçada, pois antes de algo acontecer pensamos que vamos sofrer muito, para na altura perceber que tudo passa nem grandes ondulações.
Agora vou preparar-me para o que resta do meu livro.
Hoje lembrei-me de uma rábula humorística onde o saudoso Raul Solnado era figura central. Nessa peça televisiva dos anos setenta, logo a seguir ao 25 de Abril, a personagem que Solnado representava era um desempregado que se manifestava com muitos outros na rua e com as costumadas palavras de ordem da época: "Trabalho sim Desemprego não". Um suposto empregador chegava perto de manifestante e oferecia-lhe trabalho. Ao que o outro respondia: "Mas porquê a mim está aqui tanta gente".
Esta entrada leva-me para aquilo que tem sido a filosofia deste país nos últimos 40 anos: uma profunda falta de vontade de trabalhar, ao que se junta uma total fuga para a frente quando os problemas surgem, associada à incapacidade de cada um assumir os seus próprios erros, aludindo sempre ao passado mais ou menos recente para justificar o futuro. Maioritariamente vê-se esta atitude na classe política, toda ele muito preocupada com os terríveis acontecimentos, mas incapaz de fazer ou mandar fazer algo que seja realmente eficaz.
O País continua assim a arder. Hoje acaba aqui para logo começar ali. Extingue-se acolá, reacende-se além.
Os bombeiros andam numa roda viva. Depois, parece que não há uma voz de comando, para além do SIRESP que continua a (não) fazer das suas.
Em 2003 Mação foi vítima dos fogos. Nessa altura falou-se, como hoje se fala, em reordenar a floresta e mais uma série de iniciativas. Resultado 14 anos depois? Novo incêndio com porporções gigantecas.
Em 2005, a aldeia que não me viu nascer mas crescer, foi também vítima de um incêndio de enormes proporções. Uma dúzia de anos passados ainda são visiveís os cadáveres de árvores queimadas, já que ninguém do Parque Natural que envolve a povoação, se preocupou em cortar e limpar.
No meio deste enorme parque de características muitos especiais, o meu pai tem alguns nacos de terra. Que nessa altura do incêndio ficou com tudo queimado. Especialmente oliveiras, azinheiras, medronheiros e pinheiros. O meu pai é neste momento um homem com muita idade, o que originou que algumas dessas fazendas abraçadas pelo fogo fossem mais ou menos despresadas.
No entanto, recentemente tenho sido eu a avançar com trabalho e dinheiro para cortar o mato que cresceu a seguir ao fogo. Neste sentido apresentei um projecto ao PRD2020 de forma a captar alguma ajuda financeira. Ora quem ouviu falar os Ministros da Agricultura ficou a ideia de que agora é que haveria dinheiro para limpar matas e os terrenos semi abandonados. Profundo engano...
Como sempre a demagogia barata venceu e o meu projecto não vai ser elegível. Isto é, já gastei o dinheiro mas não vou ser ressarcido desse gasto.
Entretanto os terrenos à volta do que é meu estão, neste momento, repletos de mato, pois os seus legítimos proprietários não podem ou não querem gastar dinheiro qu eu gastei em algo que nunca será rentável.
Mais uma vez o Estado diz uma coisa todavia a realidade é bem diferente. Cortar mato, recolhe-lo, queimá-lo e depois manter o terreno livre de mais mato custa muuuuuuuuuuito dinheiro. Para dar um mero exemplo, só para o herbicida já gastei mais de 1000 euros. E ainda não está tudo. Falta pagar ainda a mão-de-obra.
Tenho que não caberá ao Estado fazer tudo... mas pelo menos não mintam. Não prometam o que sabem que nunca irão cumprir.
Certa vez ouvi um comentador televisivo dizer: um político que diga somente a verdade nunca ganhará eleições.
Se fosse o Donald Trump (de quem não gosto de todo) a proibir uma equipa de jornalistas portugueses de entrar em solo americano, o que diriam às nossas gentes?
Vá lá sejam sérios, pelo menos uma vez na vida e digam lá qual seria a vossa palavra de ordem!
Conheci os meus e tive com alguns deles uma relação muito forte. Especialmente a minha avó materna de quem herdei este meu feitio positivista. O seu marido, o meu avô Manuel, era um homem rude de palavras mas de coração mole. Foi aquele que morreu mais tarde já eu tinha filhos.
Do meu avô paterno guardo a recordação de ser uma pessoa austera. Alto, magro, distante era uma figura quase imponente. Tinha somente 12 anos quando morreu mas deixou sete filhos e um rol de histórias de vida incríveis.
Não imagino o que terei herdado deste meu avô, se herdei alguma coisa, mas sinto que não obstante aquela pose, lá onde estiver, olhará sempre por mim. A minha avó paterna sempre foi uma pessoa pouco dada e morreu relativamente cedo. E entre nós nunca houve uma relação assim... intensa.
Hoje é o dia dos avós.
De vez em quando gosto de me lembrar deles. Nem que seja num dia como este.
Muitas dos cidadãos que vivem nas grandes cidades e já sem qualquer ligação ao interior, olham para estes fogos com muita pena, para logo a seguir esquecerem o que acabaram de ver e se preocuparem com o novo reforço do Alguidares de Baixo. Ou então como será que a Xica vai contar ao pai que é um homem na nova telenovela "Bruto com'as portas"?
Estes parecem ser os verdadeiros problemas dos citadinos. Tudo o resto são desgraças e como tal "não posso ver porque sou muito sensível..."
Só que para além destes há quem sinta, como se fosse na sua pele, estas catástrofes que vão incendiando o nosso quotidiano.
Todas as manhãs, assim que me levanto, vou tentar saber como está a situação dos incêndios. Infelizmente as notícias não são na sua maioria muito boas.
Esta minha preocupação prende-se obviamente com a minha íntima relação com o campo. Se bem que tenha nascido em Lisboa desde sempre me relacionei com a aldeia de uma forma muito directa. Por exemplo ali comecei a trabalhar à jorna, no Verão, de sol a sol e a ganhar cem escudos por dia.
Esta minha ligação ao mundo rural fez de mim um homem diferente e conhecedor da dureza do campo. Fui assim talhado nesse espírito que moldou tanto lavrador luso.
Talvez por isso olhe para o que tenho, que é muito pouco, e sinta uma certa alegria de penetrar naquilo que é meu. Deste modo desde o final do ano passado investi muito dinheiro e tempo no amanho das terras, até agora improdutivas. De tal forma que me empenhei financeiramente para o fazer.
Durante fins-de-semana quase seguidos corri para a aldeia de forma a poder limpar o que havia sido cortado, antes que viesse o Estio. Fiz algumas coisas, mas não todas. O tempo escasseou!
Todo este discurso para dizer o quê? Simplesmente para afirmar com profunda tristeza, que me dói o coração ao ver tanta e tanta gente ficar sem os seus pertences, por causa do fogo. Vidas destruídas em minutos que levaram dezenas de anos a erguer...
Todos os dias leio as declarações dos políticos, sejam eles de esquerda ou de direita, e oiço muita gente a afirmar que é necessário reformar a floresta.
Eu avanço com outra ideia: reformem estes políticos. Envie-mo-los para as frentes de incêndio para saberem o que é combater um fogo. Punham-mo-los com uma enxada na mão a cavar o chão para que o fogo não alastre. E acima de tudo responsabilize-mo-los politica e civilmente por não fazerem com competência o trabalho para que foram democraticamente eleitos.
Até esse dia, que acredito que aconteça, vamos assistindo à amargura dos que ficam sem nada.
No pouco tempo que andei na escola tive um professor que um dia disse aos alunos, já não me recordo a que propósito: “Errar é humano, permanecer no erro é estupidez”.
Esta máxima, que não era obviamente da sua exclusiva autoria, acompanhou-me todo este tempo. Tenho, por isso, tentado aprender com os erros cometidos, de forma a não os repetir.
Já andava desconfiado que este professor não havia sido mestre de nenhum dos actuais políticos portugueses, tal é quantidade de erros que constantemente se comentem. Repetidamente. Mas este fim de semana tive a certeza disso.
Após os trágicos acontecimentos de Pedrogão Grande eis que é a vez da Sertã se ver também abraçada por diversos incêndios de grandes dimensões.
Não obstante até agora não terem existido vítimas, a verdade é que os bombeiros e a Protecção Civil não conseguem dar conta do recado. Isto é: os erros cometidos em Pedrogão Grande continuam a perpetuar-se nestes novos fogos.
Não percebo nada das técnicas para apagar incêndios, todavia custa-me aceitar que perante a evidência da história se voltar a repetir, o Estado ou a Protecção Civil não tenham reforçado os meios de vigília das nossas florestas.
Cada vez estou mais desconfiado que há demasiados interesses paralelos nestes fogos. Culpam-se muitas vezes os madeireiros, mas por este andar até esta profissão desaparece, tal é a velocidade com que se queimam florestas.
Depois não se admirem, que daqui a uns anos, Portugal seja uma continuação do deserto do Saahra.
As recentes declarações do candidato do PSD à Câmara de Loures trouxeram à tona velhas guerras partidárias e não menos antigas ideias retrógradas. Mas nada disto me interessa. Cheira-me a pura demagogia política. Tão-só!
Tenho assim que o racismo faz-se, na maioria das vezes, mais pela complacência do que pela afronta. Aquela ignóbil ideia do coitado, por ser desta ou daquela raça, parece-me mais discriminatória do que eu chamar alguém de preto, amarelo, branco ou cigano. Se o forem, qual o problema?
Depois há os estigmas.
Outra ideia que é fabricada pela sociedade e que rotula pessoas, raças e até locais. A povoação onde vivo é um exemplo perfeito. A cidade da Amadora é quase sempre conotada como local mal frequentado e deveras problemático, especialmente por causa de pessoas oriundas de África..
Eis um erro crasso. Nesta cidade e sede de concelho já tive mais problemas com os brancos do que com qualquer outra raça que cá reside. Ainda por cima alguns deles autarcas e que se achavam, por inerência do cargo, acima da lei.
Mas sei de gente que quando se fala da Amadora ficam de cabeça à banda e engelham o nariz. Olvidam certamente que Ricardo Salgado, que vive na Quinta da Marinha, roubou muito mais que todos. Provavelmente nele não são roubos, somente desvios. Deve ser do local… portanto!
Normalmente as sociedades têm códigos de conduta que são mais ou menos assumidos por todos os elementos dessa mesma sociedade. Deste modo o que sair para fora das margens previamente estabelecidas ou não concordar com as regras estabelecidas será sempre visto de lado. Muitas vezes até votado ao ostracismo. E isto acontece em todas as raças, credos, sociedades ou meros bairros.
Portanto olhemos para as outras raças como gostaríamos que as outras olhassem para a nossa.
Hoje saí mais cedo do que o habitual do trabalho. Atravessar a Ponte 25 de Abril é nesta altura do ano um estrafego, que piora à sexta-feira.
Assim eis-me em casa bastante cedo para iniciar uma rotina anual: limpar a casa.
Como não vivo aqui permanentemente e só cá venho ao fim de semana, deixo para o Verão, época dos dias longos, para avançar com esta proposta.
Comecei como sempre pelo sotão onde moram grande parte dos meus rádios, gravadores e acima de tudo os meus papéis... Daí chamar-lhe, o meu museu!
Fiz entretanto uma escolha nalgumas pastas velhas, de forma a libertar espaço, quando encontrei dentro de um caderno a figura abaixo e que corresponde a um bilhete de autocarro.
Curiosamente este não era capicua, como eu tanto gostava.
Cinco escudos custou naquela altura o trajecto. Mas não imagino donde terei saído e para onde terei ido.
Mas foi um achado que guardei novamente com enorme religiosidade, como se fosse uma relíquia santificada.