A dor de quem tem!
Muitas dos cidadãos que vivem nas grandes cidades e já sem qualquer ligação ao interior, olham para estes fogos com muita pena, para logo a seguir esquecerem o que acabaram de ver e se preocuparem com o novo reforço do Alguidares de Baixo. Ou então como será que a Xica vai contar ao pai que é um homem na nova telenovela "Bruto com'as portas"?
Estes parecem ser os verdadeiros problemas dos citadinos. Tudo o resto são desgraças e como tal "não posso ver porque sou muito sensível..."
Só que para além destes há quem sinta, como se fosse na sua pele, estas catástrofes que vão incendiando o nosso quotidiano.
Todas as manhãs, assim que me levanto, vou tentar saber como está a situação dos incêndios. Infelizmente as notícias não são na sua maioria muito boas.
Esta minha preocupação prende-se obviamente com a minha íntima relação com o campo. Se bem que tenha nascido em Lisboa desde sempre me relacionei com a aldeia de uma forma muito directa. Por exemplo ali comecei a trabalhar à jorna, no Verão, de sol a sol e a ganhar cem escudos por dia.
Esta minha ligação ao mundo rural fez de mim um homem diferente e conhecedor da dureza do campo. Fui assim talhado nesse espírito que moldou tanto lavrador luso.
Talvez por isso olhe para o que tenho, que é muito pouco, e sinta uma certa alegria de penetrar naquilo que é meu. Deste modo desde o final do ano passado investi muito dinheiro e tempo no amanho das terras, até agora improdutivas. De tal forma que me empenhei financeiramente para o fazer.
Durante fins-de-semana quase seguidos corri para a aldeia de forma a poder limpar o que havia sido cortado, antes que viesse o Estio. Fiz algumas coisas, mas não todas. O tempo escasseou!
Todo este discurso para dizer o quê? Simplesmente para afirmar com profunda tristeza, que me dói o coração ao ver tanta e tanta gente ficar sem os seus pertences, por causa do fogo. Vidas destruídas em minutos que levaram dezenas de anos a erguer...
Todos os dias leio as declarações dos políticos, sejam eles de esquerda ou de direita, e oiço muita gente a afirmar que é necessário reformar a floresta.
Eu avanço com outra ideia: reformem estes políticos. Envie-mo-los para as frentes de incêndio para saberem o que é combater um fogo. Punham-mo-los com uma enxada na mão a cavar o chão para que o fogo não alastre. E acima de tudo responsabilize-mo-los politica e civilmente por não fazerem com competência o trabalho para que foram democraticamente eleitos.
Até esse dia, que acredito que aconteça, vamos assistindo à amargura dos que ficam sem nada.